Porque é tão difícil mudar o comportamento humano?
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Apresentamos 5 ideias para ajudar a compreender porque é tão difícil mudar o nosso comportamento:
1. A certeza vs a ambiguidade
Queremos mudar mas, ao mesmo tempo, não queremos! Por muita certeza que as nossas palavras de mudança revelem, existe sempre uma parte de nós que está bem como está. Tendemos a ignorar que o comportamento a alterar serve frequentemente uma função psicológica que não é visível, mas é importante. Ou já foi importante no passado e agora tornou- se um hábito. Exemplo: Roer as unhas não faz sentido para aquele jovem adulto, mas durante a adolescência foi o mecanismo automático que o corpo encontrou para aliviar a pressão dos exames. E o mecanismo manteve-se.
Ou seja, o comportamento a mudar pode ser (ou ter sido) mais importante para a nossa estabilidade interior do que reconhecemos. O que significa que apenas quando forem encontradas formas de substituir, tornar desnecessária ou no mínimo tornar consciente essa sua função “escondida”, o comportamento estará “disposto” a mudar.
2. A preguiça vs a “força de vontade”
Ambos são mitos sem grande significado real que mais baralham a questão da mudança do que ajudam a compreendê-la. Na verdade, ninguém é “preguiçoso” para tudo - o que significa que já encontrou a “força de vontade” para algumas decisões (a motivação certa). E ninguém tem “força de vontade” para tudo - o que significa que às vezes também é “preguiçoso” (ou seja, falta-lhe a motivação).
Hoje sabemos que o que motiva de forma mais duradoura é aquilo que valorizamos mais profundamente, que nos faz sentir melhor interiormente. Que nos aproxima de quem queremos ser. Pelo contrário, motivações como resposta a pressões de fora, sentimentos de culpa, ou porque é “o que todos fazem” não geram satisfação, apenas proporcionam o “alívio” imediato e tendem a não se manter.
3. O habitual vs o desconhecido
Mudar significa deixar o conforto para abraçar algo que não conhecemos e por isso nos deixa ansiosos. Algo que pode enriquecer-nos e trazer novas dimensões à vida, mas que também pode deixar-nos “pendurados” e destroçados quando menos esperamos. Mais vale um “pássaro na mão, do que dois a voar” diz o ditado. Mas este é um ditado conservador - se todos o seguíssemos ninguém “voava”. Não se descobriam novos caminhos, para “fora” e também para “dentro” de nós. E é bom acreditar que em todos nós há uma força inata que quer mais e melhor, que quer crescer, descobrir e expressar-se.
A inércia do primeiro passo pode mesmo ser o maior e mais simples obstáculo. E para a vencer não funcionam grandes rasgos de inteligência. Até porque o receio do desconhecido é sobretudo emocional e, por definição, pouco racional.
4. O “tudo” vs o “nada”
Temos tendência para pensar a preto e branco. Mas é no meio que a virtude se passeia e é de tons de cinzento que a vida mais se faz, inevitavelmente. Não permitimos sequer a possibilidade de mudança, ignorantes de que pequenos avanços acumulam-se até atingir a “massa crítica” de mudança e que, infelizmente, os saltos quânticos são raros.
Imagine o pássaro que raminho a raminho constrói um ninho maravilhosamente completo, que apenas há dias parecia impossível de conceber. Ao invés de decidir “vou deixar de comer naquele restaurante” ou “a partir deagora, só alimentos saudáveis no frigorífico” ou “vou treinar para a maratona, pois não faço por menos”, se, a longo prazo, acumularmos uma vitória de cada vez podemos ser bem sucedidos. Começar pouco a pouco e não de uma só vez.
5. O desafio vs o medo
E se não correr bem? E se eu falhar nos meus projetos? E se não conseguir manter esse plano de atividade física? Estes pensamentos descrevem o natural medo de falhar. Todos o temos porque ninguém gosta de ficar mal visto. E tantas vezes não mudamos porque receamos ficar pior depois de mais um fracasso do que antes de o tentar.
Felizmente, a ilusão que alimenta mais esta fonte de inércia pode ser desmontada: é do acumular de pequenas derrotas que se aprende a vencer a batalha final. E sempre que tentamos há algo novo que se aprende, que nos torna um pouco mais fortes para o próximo assalto. O medo justifica-se. Ninguém gosta de “perder”, mas muitos dos que ultrapassaram difíceis obstáculos (ex: que perderam bastante peso e mantiveram-no saudável para sempre) não o conseguiram à primeira. Tentaram muitas vezes até alcançarem o resultado pretendido.
O que não nos mata, torna-nos mesmo mais fortes e até mais sábios, sobretudo sobre nós próprios.
Podemos criar boas condições para que a mudança surja com mais probabilidade. Podemos aceitar os pequenos sinais de que ela se aproxima e aumentar a confiança em nós para que arrisquemos a tentar. Acreditamos convictamente que a mudança, grande ou pequena, é possível para todos Mas devemos reconhecer - e, mais difícil, devemos aceitar - que a mudança só chega no dia e na hora em que tiver de chegar. E que talvez nunca nos seja dado a compreender porque foi naquele momento e não antes.
Será o dia de uma epifania? Será uma revelação de fé? Será a sorte do baralho? Talvez seja tudo isso e também o reconhecimento de que o ser humano é maravilhosamente complexo e retira um prazer especial em resistir a ser explicado. A ser previsível.
Autor: Pedro Teixeira
Professor de Faculdade de Motricidade Humana